30 junho 2017

Sexta básica de (in)utilidades

Qual a idade ideal para casar?

De uma maneira geral, a melhor idade para casar é aquela em que se atingiu a maturidade física e mental. Naturalmente, esta varia de indivíduo para indivíduo, embora se considere que oscila entre os 22 e os 30 anos, devendo o marido ser quatro a sete anos mais velho que a mulher. Também neste último ponto surgem excepções. (…) O importante é que o casal seja emocionalmente estável e mentalmente amadurecido para suportar as tensões e as sobrecargas inerentes ao casamento.

Embora muitas vezes seja necessário adiar o casamento por razões económicas, é de presumir que um homem que continua solteiro depois dos 35 anos se decidiu pelo celibato. Este facto pode indicar a existência de uma personalidade incompatível com um bom marido ou com um bom pai. Por tal motivo, não se deve tentar levar ao casamento um solteirão inveterado.

O desejo e a determinação de fazer do casamento uma união feliz constituem uma das armas mais importantes contra o divórcio. Como disse alguém, "a tolerância, a compreensão e o bom humor constituem um capital mais precioso, no casamento, do que uma ilusória idealização do companheiro".

E, antes de apreciar as atitudes emocionais e os ajustamentos sexuais que podem contribuir para um casamento bem sucedido, convirá focar alguns problemas fundamentais relativos à saúde fisica.


O Livro da Saúde – Enciclopédia Médica Familiar
Selecções do Reader's Digest (Portugal, 1976)





22 junho 2017

A visita de uma familiar história


É recorrente o uso de um determinado mote na teledramaturgia brasileira: a vingança. Uma mesma estrutura, diversas vezes utilizada em nossas novelas, garantiu o sucesso de várias tramas. Com algumas variações ao redor da história principal, o enredo é basicamente o seguinte: uma moça é expulsa de uma cidadezinha, ou levada a deixar o lugar, seja pelo julgamento inclemente e moralista de seus habitantes ou por circunstâncias abusivas. Injustiçada, a personagem retorna, muitos anos depois, em busca de vingança.

Ao que tudo indica, o público se identifica com esse tipo de heroína vingadora, uma espécie de “mocinha”, porém forte, independente e destemida, ao contrário das sofredoras, românticas e ingênuas mocinhas tradicionais. Essa estrutura ficou célebre com a peça A Visita da Velha Senhora (Der Besuch der Alten Dame), do suíço Friedrich Dürrenmatt (1921-1990), escrita em 1955.

A peça estreou no começo de 1956, na Suíça, e pouco depois, na Alemanha. Em poucos meses, conquistou plateias da França, Inglaterra, Japão e EUA. No Brasil, o espetáculo, dirigido por Walmor Chagas, foi apresentado por Cacilda Becker, em 1962. A atriz interpretou o papel da protagonista Clara Zachanassian.

Na provinciana Güllen, cidadezinha perdida em alguma parte da Europa central, nasce Clara, de família humilde. Aos 17 anos, apaixona-se perdidamente por um jovem ambicioso, Alfred, com quem vive um caso de amor. Grávida, é abandonada pelo rapaz, que pretendia se casar com outra moça da cidade, cuja família tinha algumas posses. Oprimida, Clara exige justiça para si e para o bebê que ia ter. Alfred e todos os homens "honestos" da cidade, porém, envolvem-na em um processo humilhante, após tramar para fazê-la parecer uma moça de índole duvidosa e indigna. Ao fim do processo, ela acaba sendo escorraçada da cidade. 


Cacilda Becker em A Visita da Velha Senhora
Obrigada a sair de Güllen, Clara torna-se prostituta para sobreviver e, depois, esposa  de um milionário mais velho, Zachanassian, dono de metade da Europa. "O mundo fez de mim uma mulher da vida e eu quero fazer dele um bordel", apregoa Clara. Décadas depois, já viúva, ela retorna a Güllen, com o propósito secreto de vingar-se da injustiça da qual fora vítima na mocidade. Para isso, ajuda a pobre cidade a se recompor e a progredir. Mas sua ajuda tem um alto preço: jogar uns contra os outros, revelando a verdadeira natureza hipócrita, mesquinha e cruel daquelas pessoas, incluindo seu maior alvo: Alfred. A integridade moral dos cidadãos não é inabalável. À medida que a cidade começa a antecipar seu futuro de prosperidade, cresce o número dos que reconhecem a injustiça cometida à Clara no passado.

Qualquer semelhança com tramas de telenovelas brasileiras não é mera coincidência. Exemplos não faltam. Coincidentemente, o canal Viva exibe duas dessas emblemáticas tramas atualmente: Fera Radical (1988) e Tieta (1989-1990), grandes sucessos da década de 1980.


Em Fera Radical (Rede Globo), de Walter Negrão, Cláudia (Malu Mader) quer vingar o extermínio de sua família, ocorrido 15 anos antes na pequena Rio Novo. Mesmo tendo deixado a cidade após o atentado, a moça nunca deixou de responsabilizar os Flores — família de fazendeiros ricos — pela tragédia de seu passado, quando ainda era uma menina. Ela retorna a Rio Novo e começa a trabalhar para os Flores, buscando esclarecer as circunstâncias da morte de sua família e com o intuito de vingar-se de seus supostos algozes. Para isso, Cláudia se envolve com os irmãos Fernando (José Mayer) e Heitor Flores (Thales Pan Chacon), cativa o patriarca Altino (Paulo Goulart) e desperta a ira da matriarca Joana (Yara Amaral).

Malu Mader em Fera Radical (1988)
Em Tieta (Rede Globo), novela de Aguinaldo Silva, baseada no romance homônimo de Jorge Amado, o ponto de partida remete mais diretamente à peça A Visita da Velha Senhora. Tieta (Betty Faria), agora rica, volta à empobrecida e esquecida Santana do Agreste, da qual fora expulsa na juventude, para acertar as contas com seu triste passado. Tieta havia sido escorraçada da cidadezinha 20 anos antes, a cajadadas, pelo pai, insuflado pela irmã Perpétua (Joana Fomm). A cidade testemunhou tudo calada. Agora Tieta retorna, exuberante, distribuindo presentes e trazendo o progresso para o lugar. A cidade toda, por interesse, passa a bajulá-la, sem nem imaginar que o verdadeiro intento da benfeitora é mostrar ao povo de Santana do Agreste que ele continua tão hipócrita, moralista e injusto quanto no passado.

Betty Faria em Tieta (1989)
Além desses dois sucessos, atualmente em exibição no Viva, outras telenovelas brasileiras utilizaram a mesma premissa, contada de formas diversas, mas que remetem à atemporal peça de Dürrenmatt. A trama central de Chocolate com Pimenta (Rede Globo, 2003-2004), de Walcyr Carrasco, é outro exemplo. Ana Francisca (Mariana Ximenes) volta à cidadezinha onde havia sido ridicularizada, prometendo a si mesma vingança contra os moradores interesseiros e cruéis que a haviam humilhado, incluindo seu amor do passado, Danilo (Murilo Benício).

Mariana Ximenes em Chocolate com Pimenta (2003)
Variações com protagonistas masculinos jurando vingança também não faltaram. Em Fera Ferida (Rede Globo, 1993-1994), de Aguinaldo Silva, Feliciano Júnior (Edson Celulari) retorna à pequena Tubiacanga 15 anos após ter sido expulso da cidade com seus pais, que acabaram assassinados. Sob a identidade de Raimundo Flamel, Feliciano vai se vingar dos inescrupulosos e corruptos de Tubiacanga, responsáveis pela perda de sua família, quando ele ainda era um adolescente. 

Voltando ainda mais no tempo, é possível encontrar exemplos mais antigos na teledramaturgia brasileira, como Cavalo de Aço (Rede Globo, 1973), de Walter Negrão, e Os Inocentes (TV Tupi, 1974), de Ivani Ribeiro. Ambas apoiaram suas tramas centrais na mesma ideia de A Visita da Velha Senhora. (Para mais detalhes sobre as novelas mencionadas, acesse o site Teledramaturgia). 

Edson Celulari em Fera Ferida (1993) e Tarcísio Meira em Cavalo de Aço (1973)
É claro que a transposição da peça não ficou restrita à TV. Em 1964, a história já havia ganhado uma versão no cinema, intitulada A Visita (The Visit). Estrelado e coproduzido por Ingrid Bergman e Anthony Quinn, o filme (ótimo, por sinal) foi dirigido por Bernhard Wicki e teve o roteiro adaptado diretamente da peça. O nome de Clara, no entanto, foi alterado para Karla, e o de Alfred para Serge.


O texto dramático de Dürrenmatt, apesar de escrito na década de 1950, é aplicável a qualquer época. Talvez seja essa uma das razões pelas quais as telenovelas por ele inspiradas tenham agradado ao público em diferentes épocas e situações. Além de retratar uma tragédia do ressentimento, um notável estudo de psicologia social e uma sátira ao poder do dinheiro, A Visita da Velha Senhora ainda dissecou temas como a corrupção e o poder. Não foi à toa que a peça consagrou seu autor mundialmente. "Sua visão de mundo é pessimista, frustrante, mas sempre comprometida com uma crítica total ao nosso tempo", reconheceu o crítico e historiador do teatro norte-americano John Gassner, sobre Dürrenmatt.


Friedrich Dürrenmatt
O autor classificou sua obra como uma "comédia trágica", pois escolheu a ironia e o humor agressivo para mesclar tragédia e comédia em sua amarga visão de mundo. Ele ataca o dinheiro, os mecanismos de ascensão ao poder, o casamento e o mau uso da tecnologia. Trata-se de uma uma peça engraçada, mas o cômico de Dürrenmatt envolve um sentido trágico que o espectador vai descobrindo aos poucos. 

"Dürrenmatt não é um otimista em relação ao gênero humano e não tem nenhuma ilusão sobre o homem. Onde quer que viva, sob que bandeira se esconda, o homem sempre acaba sucumbindo: ao poder, ao dinheiro, às instituições. Uns esmagam, outros sao esmagados e a decantada liberdade, proposta em tantas revoluções, não existe. Para Dürrenmatt, a liberdade só pode ser encontrada na arte." (A Visita da Velha Senhora, Coleção Teatro Vivo, Abril Cultural, 1976)

07 junho 2017

Cinco filmes de Cher que marcaram os anos 1980



Cher é um ícone da música que dispensa apresentações. Desde os anos 1960, ela se destaca não apenas como cantora, mas também como apresentadora e atriz. Como bem diz a página dedicada a ela na Wikipédia, Cher é "reconhecida por ter ajudado a difundir os conceitos de autonomia feminina e autorreinvenção na indústria do entretenimento". Mais: "Famosa pela voz grave e por ter trabalhado em várias áreas da mídia, bem como por reinventar constantemente sua música e imagem. Tudo isso rendeu a ela o apelido de Deusa do Pop."

Meu primeiro contato com Cher foi por meio dos filmes, na década de 1980. Extremamente divertidos ou emocionantes, eram o entretenimento perfeito. Constantemente reprisados na TV ou com destaque nas videolocadoras, os filmes estrelados por ela não passavam batidos. Por isso a Cher atriz foi, para mim, mais representativa do que a Cher cantora. Durante minha infância, foi quando sua carreira no cinema deu um salto e viveu seu momento mais prolífico, entre 1983 e 1988. Drama, comédia, suspense, romance... Tinha Cher para todos os gostos. Sua filmografia é variada e cheia de produções elogiadas e premiadas, que marcaram aquela década. 


Listei aqui, por ordem cronológica, cinco desses filmes imperdíveis:


Silkwood - O Retrato de uma Coragem
(Silkwood, 1983)
Direção: Mike Nichols


Drama com roteiro de Nora Ephron e Alice Arlen, inspirado na vida da ativista sindical Karen Silkwood (interpretada por Meryl Streep), morta em um suspeito acidente de carro enquanto investigava irregularidades na fábrica de plutônio onde trabalhava. O elenco é um show à parte. Cher, que interpretou Dolly, amiga de Karen, levou o Globo de Ouro de Melhor Atriz Coadjuvante. O filme ainda teve várias indicações ao Oscar.


Marcas do Destino 
(Mask, 1985)
Direção: Peter Bogdanovich


O filme é baseado na história real de Rocky Dennis, um adolescente que nasceu com displasia craniodiafisária (doença óssea caracterizada pelo alargamento dos ossos craniofaciais), razão pela qual o jovem tem uma grave deformação no rosto e no crânio. Muitos acham que ele usa uma máscara, tamanha é sua deformidade. Cher vive a mãe de Rocky (Eric Stoltz), Florence "Rusty" Dennis, que está sempre com uma turma de motoqueiros amigáveis. Entre eles, seu namorado, interpretado por Sam Elliott. Rocky é um rapaz extremamente inteligente, bem-humorado e gentil. Mas, apesar de querido pela família pouco convencional, o rapaz é tratado com medo, pena, estranheza e deboche por quem não o conhece. Em 1985, no Festival de Cannes, o filme recebeu duas indicações. Cher venceu na categoria de Melhor Atriz. Em 1986, foi indicado nas categorias de Melhor Ator Coadjuvante (Eric Stoltz) e Melhor Atriz (Cher) no Globo de Ouro. Ganhou o Oscar de Melhor Maquiagem.


As Bruxas de Eastwick
(The Witches of Eastwick, 1987)
Direção: George Miller


Comédia cheia de efeitos especiais, com roteiro baseado no livro homônimo de John Updike. Na pitoresca cidadezinha de Eastwick, em Rhode Island, três mulheres entediadas — Alexandra (Cher), Jane (Susan Sarandon) e Sukie (Michelle Pfeiffer) — reúnem-se todas as quintas-feiras para se divertir e bater papo sobre assuntos variados assunto. Mas o tema da conversa é quase sempre o mesmo: os homens e seus defeitos, e como seria, em tese, o homem ideal. Elas se envolvem com o misterioso ricaço Daryl Van Horne (Jack Nicholson), que cria uma verdadeira guerra dos sexos e coloca vida da pacata cidade (e principalmente das três amigas) de cabeça para baixo. O filme eve inúmeras indicações a vários prêmios, incluindo duas para o Oscar. 


Sob Suspeita
(Suspect, 1987)
Direção: Peter Yates


Suspense tenso também que funciona como drama de tribunal. Um juiz comete suicídio e, logo após, sua secretária é encontrada morta. Carl Wayne Anderson (Liam Neeson), um indigente surdo-mudo, é preso pelo assassinato da moça. A defensora pública Kathleen Riley (Cher) é designada pela corte para ser a advogada do indigente acusado. Ela tem dúvidas se ele é realmente o culpado, e decide achar o verdadeiro assassino. Com a ajuda de um assessor parlamentar (Dennis Quaid) que faz parte do júri, descobre um perigoso círculo de corrupção no Judiciário. 


Feitiço da Lua
(Moonstruck, 1987)
Direção: Norman Jewison


Nesta irresistível comédia romântica, Cher vive Loretta Castorini, uma jovem viúva, sem sonhos ou ilusões, que está noiva de Johnny Cammareri (Danny Aiello), um homem mais velho e sem grandes atrativos. Mas, ao conhecer seu futuro cunhado de temperamento forte, o padeiro Ronny Cammareri (Nicolas Cage), Loretta se apaixonada por ele. Os conflitos e alegrias da família ítalo-americana temperam essa inteligente comédia que recebeu várias indicações ao Oscar e foi uma das maiores bilheterias de 1988. Venceu nas categorias de Melhor Atriz (Cher), Melhor Atriz Coadjuvante (Olympia Dukakis) e Melhor Roteiro Original (John Patrick Shanley). Entre as outras premiações, Cher ganhou também o Globo de Ouro de Melhor Atriz.