30 março 2012

O irresistível lado B (de brega)

Com o tecnobrega cada vez mais em alta e propagado em várias camadas da nossa sociedade, é possível observar como esse fenômeno de "ser brega" virou uma coisa pop, divertida e até aceitável nos dias de hoje. Aliás, atualmente é difícil definir "brega", especialmente na categoria musical. Na minha opinião há vários tipos de brega. Sobre o termo, a Wikipedia diz que "sua conceituação como estética musical tem sido um tanto difícil – uma vez que não há um ritmo musical propriamente 'brega' – e alvo de discussões por estudiosos e gente do meio musical. Mesmo sem ter estabelecidas características suficientemente rígidas, o termo praticamente foi alçado à condição de gênero".


Esses artistas considerados bregas começaram a invadir as nossas rádios a partir da década de 1970. Já no comecinho dos anos 80, os programas de televisão de Sílvio Santos, Chacrinha, Raul Gil, Carlos Imperial e Bolinha serviam para catapultar a carreira desses astros da canção suburbana (na época ainda não se usava o termo "brega"). Seus compactos vendiam como água. Eram os reis dos porteiros, taxistas e empregadas domésticas, entre outros.

Carlos Imperial, Chacrinha e Silvio Santos
Existem no Brasil os cantores bregas que não eram tidos como bregas propriamente. No começo eram até levados a sério, mas tornaram-se cafonas, canastrões e datados com o passar do tempo. Alguns duraram pouquíssimo. Chegaram a fazer sucesso, foram populares, venderam muitos discos, mas acabaram causando uma espécie de "ressaca" e se apagaram da nossa memória. Desse tipo existem duas ramificações: os que conseguiram voltar em grande estilo e os que permaneceram parados no tempo e foram esquecidos.

Sidney Magal
Quando a música brega passou de cafona à cult, nos anos 2000, era permitido, lícito e até cool curtir esse som. Até porque ele havia se tornado um clássico. Exemplo: Sidney Magal, Gretchen, Rosana. Uma nova geração de fãs e entusiastas passou a ouvir, homenagear e difundir esses artistas, que hoje são considerados divertidos, interessantes e garantia de festa animada. Voltaram a ser muito requisitados para shows, comerciais, aparições na TV e entrevistas.

Rosana e Gretchen, duas musas bregas dos anos 80
A outra ramificação é o tipo que ficou parado no tempo, lá atrás, e desapareceu de vez. A maioria das pessoas nem se lembra, pois eles sumiram totalmente da mídia. Exemplo: Julia Graciela, Miss Lene, Juanita, Trio Los Angeles.

Miss Lene e Julia Graciela
Juanita
Dando continuidade à vasta linhagem do brega, existem aqueles que desde o começo se firmaram no mercado musical como grandes vendedores de discos, a despeito de serem taxados de bregas. Conquistaram enorme espaço na mídia e lugar cativo no gosto popular. Exemplo: Amado Batista, Odair José, Waldick Soriano. Clássicos absolutos, nem se discute.

Amado Batista, Odair José e Waldick Soriano
Curiosamente, existem os bregas por opção. São aqueles 'fabricados' com o intuito de serem bregas mesmo. Como uma espécie de marca que levam com orgulho. Ou então reforçaram e assumiram seu lado brega, já que hoje é "legal" ser brega. Exemplo: Genival Lacerda, Falcão, Reginaldo Rossi.

Genival Lacerda
Há os bregas que, apesar de não terem a pretensão de ostentar esse título – às vezes até repudiado – vão carregá-lo enquanto existirem. Fazem tremendo sucesso e arrancam suspiros do povão. Exemplo: José Augusto, Calypso, Michel Teló.

E existem também os bregas que, décadas atrás, eram extremamente populares e até tiveram seu momento 'sério', mas a seriedade não colou. Atualmente andam sumidos e permanecem no imaginário brega nacional. Exemplo: Gilliard, Jane e Herondy, Ovelha.

Ovelha e Gilliard

Jane e Herondy
Joanna
Curioso é ver que alguns artistas fizeram o caminho inverso, involuntariamente, creio eu. É o caso de Joanna, que no começo dos anos 80 era um dos nomes da MPB que dava a impressão de que ocuparia o mesmo patamar de Gal Costa ou Simone, por exemplo. Mas hoje, sumida do showbizz há tempos, é considerada brega. Em uma matéria da Veja de 28 de janeiro de 1981, intitulada "A canção suburbana", o futuro de Joanna no brega já se insinuava: "Quem garante que uma cantora como a melosa Joanna ainda será sucesso daqui a dez anos?".

Fábio Júnior é outro que viveu (e ainda vive) o sucesso popular. Mas a fama de cantor romântico dos anos 80 rapidamente adquiriu contornos de brega. Seja como for, ele ainda se vale de sua reputação de conquistador incorrigível. Continua fazendo shows pelo país e levando mocinhas e senhoras e soltarem gritinhos apaixonados.

Como a lista de nomes do brega é vasta, na próxima semana preparo uma nova postagem com mais detalhes, nomes de artistas e seus irresistíveis hits bregas.

26 março 2012

Porcos, elefantes e doninhas

Sissy Spacek em Carrie, a Estranha 

Depois que Carrie White levou um banho de sangue de porco durante seu baile de formatura, o cinema de terror nunca mais foi o mesmo. Precursora das vítimas de bullying, a personagem Carrie, vivida por Sissy Spacek no filme homônimo, se cansa de ser alvo constante de piadas e deboches dos colegas de colégio e decide se vingar. Como? Colocando em prática seus poderes de telecinese (a suposta capacidade de mover fisicamente objetos com a força da mente). 

O filme, baseado no primeiro best-seller de Stephen King, teve direção de Brian De Palma e foi muitíssimo bem aclamado pela crítica e pelo público. Um feito até então incomum para um filme de terror, considerado um gênero 'menor'. As atuações impecáveis de Sissy Spacek no papel-título e Piper Laurie como mãe de Carrie valeram até mesmo indicações ao Oscar de Melhor Atriz e Melhor Atriz coadjuvante para as duas, respectivamente.

O sucesso de Carrie originou uma série de pastiches, alguns bem interessantes por sinal. O primeiro deles — e um dos melhores — foi o modesto A Iniciação de Sarah (The Initiation of Sarah), feito para a TV em 1978. Novamente o mote era uma garota considerada feiosa  e introvertida — a Sarah do título — desprezada pelas colegas de faculdade e constantemente ridicularizada. Mas assim como Carrie, Sarah (Kay Lenz) tem poderes paranormais e acaba dando vazão a eles quando não aguenta mais tanta humilhação por parte das esnobes e cruéis colegas.

Para piorar a situação, Sarah é irmã adotiva de Patty (Morgan Brittany), uma moça bela e muito popular entre as colegas. As duas são de irmandades estudantis diferentes. A de Patty é Alpha Nu Sigma (ANS), a mais disputada e chique do campus. A de Sarah é Phi Epsilon Delta (PED), reconhecida por sua reputação obscura e decadente. A perversa Jennifer Lawrence (Morgan Fairchild), líder das calouras da ANS, obriga Patty a humilhar a irmã em público, em uma das cenas mais memoráveis do filme: ela ordena que Patty faça um juramento, na frente de todos, de jamais se enturmar com as esquisitas garotas da PED — "porcos, elefantes e doninhas" (em inglês, pigs, elephants and dogs).

Patty (Morgan Brittany) e Sarah (Kay Lenz)
Instigada e incentivada por Mrs. Erica Hunter (Shelley Winters, ótima como sempre), líder da PED, Sarah passa a treinar para controlar seus poderes e assim se vingar de Jennifer e todas as garotas da ANS. Clichês não faltam, mas neste caso eles são justamente o que mais diverte e prende o telespectador. A Iniciação de Sarah ganhou um remake em 2006 (se é que se pode chamar assim, já que não foi fiel ao original), mas obviamente não chega aos pés do primeiro, que alcançou considerável sucesso no final dos anos 70 e foi exibido inúmeras vezes na TV entre os anos 80 e 90. (A última vez que o vi na TV foi por volta de 1996, no extinto Cine Trash, apresentado por Zé do Caixão, na Bandeirantes).

Mrs. Hunter (Shelley Winters) e Sarah (Kay Lenz)
O trio de protagonistas - Kay Lenz, Morgan Fairchild e Morgan Brittany - são consideradas típicas atrizes de TV americanas, todas muito populares por papéis e participações em séries e telefilmes. Shelley Winters é a única 'estrela de cinema' de verdade do filme, ainda que naquela época sua carreira se resumisse à TV. Atenção para Robert Hays, o galã atrapalhado de Apertem os Cintos... O Piloto Sumiu! (1980), em seu papel de estreia como o namorado de Jennifer Lawrence. Tisa Farrow, irmã caçula de Mia Farrow, também teve um pequeno papel como Mouse, amiga de Sarah.

Kay Lenz, Morgan Fairchild e Morgan Brittany

Mouse (Tisa Farrow)

Morgan Fairchild e Robert Hays

16 março 2012

O fino sessentão

Monique e Pedro
No final dos anos 70, uma campanha dos cigarros Chanceller causou sensação nos quatro cantos do país. O modelo da campanha era Pedrinho Aguinaga, considerado, naquela década, o mais bonito do Brasil. Além de garoto-propaganda de cigarro, ele foi modelo, astro de bailes de debutantes e ator de filmes nacionais. Virou a cara do cigarro Chanceller, sob o slogan “O fino que satisfaz”. Foi noivo da então modelo iniciante Monique Evans, com quem teve um filho. O casal era considerado o exemplo de beleza jovem do Brasil. As mulheres o cobiçavam e os homens o copiavam.

Mas hoje muita gente se pergunta por onde anda o moço. De lá pra cá muita água rolou: cigarro deixou de ser chique e passou a ser condenado na sociedade, Pedrinho sumiu da mídia, Monique ficou, digamos, um tanto quanto aloprada, embora seu nome sempre tenha se mantido nos programas e colunas de fofoca. É comum vê-la na TV. Mas de Pedrinho pouco se fala. As ex-cocotas ainda suspiram ao se lembrar dele. Fazendo uma rápida pesquisa na internet (e onde mais?), foi possível descobrir que ele está muito bem, obrigado.


"Eu tive que fumar quase cem cigarros para fazer aquela foto clássica, que estampava outdoors no Brasil inteiro. Depois fiquei dias no hospital, completamente intoxicado por aquela fumaça toda", contou ele ao site acritica.com. "Com a consciência que tenho hoje de todos os malefícios do cigarro, eu jamais faria. O ideal seria se você conseguisse fumar três por dia, mas é impossível".

Com Vera Fisher na capa de Fatos e Fotos
Filho de pai brasileiro (Fernando Aguinaga, o 'Barão') e mãe americana (Claudine), Pedrinho nasceu no Rio, em 20/02/1950. Aos 20 anos, se inscreveu num concurso de beleza masculina na TV Tupi (coisa inédita naquela época), no programa de Flávio Cavalcanti. A idéia era conseguir uns trocados, mas Pedrinho ganhou a primeira etapa, resolveu continuar na disputa e algumas semanas depois foi eleito “o homem mais bonito do Brasil”. Dali em diante, virou lenda. Podia ser visto nos embalos do Studio 54, em Nova York, ou em alguma boate da moda em Paris. Fez vários comerciais, participações em programas e até na novela Locomotivas (1977), além de vários filmes, entre eles o polêmico Rio Babilônia (1982, de Neville de Almeida), onde protagonizou uma cena de sexo a três numa piscina, junto com Joel Barcellos e Denise Dumont.

Também colecionava conquistas amorosas, coisa que não era nada difícil com a estampa que Pedrinho ostentava. Não havia mulher que não o desejasse. Nem isso fez com que ele - que se confessa um conquistador inveterado - se deslumbrasse. Do dentista ao cardiologista, não marca consulta, é atendido por amigos. Caminha todos os dias, só se locomove de bicicleta e faz meditação. Isso é que é simplicidade! E ainda assim, mantém a mesma elegância da década de 1970. Tão diferente dos arrivistas de hoje, que se vendem por uma capa de revista, querem alardear um "talento" que não possuem e uma beleza fake que só funciona em reality shows. E ainda fazem qualquer coisa por 15 minutos de fama na TV. Bem disse Arnaldo Bloch: "Não há roupa ou fantasia que dê jeito quando, na alma, falta classe". Mas isso Pedrinho, mesmo sessentão, tem de sobra.


Em entrevista à revista Quem (16/09/2004), ele disse que se sentia realizado. "Sou alguém que não pode reclamar da vida. Se reclamar, manda me internar que estou maluco". Bem humorado, também disse que se considera PHD: "Por Hora Desempregado', explicou. "Vivo bem porque tenho saúde. Grana tenho muito pouca, mas quero pouco. Não tenho necessidade do carro do ano. Tenho outros valores. Sou um playboy do bem. Nunca magoei as pessoas na minha 'playboíce'. Nunca quis nada que não fosse meu. Minha vida é privilegiada. Se tiver necessidade de ter alguma coisa a mais vou fazer esse movimento e conseguir o que quero".

Em 2011, no São Paulo Fashion Week, posando para campanha da grife Reserva
Confira algumas propagandas do "fino que satisfaz", publicadas em várias revistas brasileiras entre 1977 e 1979:





14 março 2012

O sucesso musical pertinho de Elizângela


"Menina, eu tinha 21 anos ali! Faz muito tempo, cara". Foi o que disse a atriz Elizângela sobre o clipe da canção Pertinho de Você, em uma entrevista para o jornal Estadão em novembro de 2008, exatamente 30 anos após o lançamento da música.

Muita gente não sabe, mas a atriz, que começou muito cedo, foi responsável por uma façanha ímpar na indústria fonográfica brasileira no final dos anos 1970: vendeu mais de 1 milhão de cópias do compacto simples Pertinho de Você, composição de Hugo Bellard. Vale lembrar que, naquela época, quem conseguia vender 100 mil discos já podia se considerar um felizardo. Imagine 1 milhão!


Pertinho de Você, lançado pela RCA, foi o compacto mais vendido de 1978 no país, ficou entre as mais tocadas por 54 semanas no Brasil e é recordista de audiência no ECAD (Escritório Central de Arrecadação e Distribuição).

O feito de Elizângela nunca foi superado e nem será, pois os compactos saíram de linha há décadas no Brasil, quando o CD invadiu o mercado e o vinil virou peça de museu. O mais engraçado é que nessa história de sucesso musical nada foi planejado.


Na verdade, tudo começou de brincadeira. Elizângela e seu então marido estavam na casa do produtor musical Hugo Bellard, no Rio de Janeiro, quando brincou sobre gravar um disco. Algumas semanas depois, Hugo compôs duas músicas para a atriz. Entre elas estava Pertinho de Você. O que nenhum dos dois sequer imaginava é que ali nascia o disco mais vendido no Brasil. A canção ganhou até clipe no Fantástico.

Hugo resolveu apostar na fita e a levou nas principais gravadoras. Ninguém acreditou no produto e todos recusaram o disco. Quando Elizângela e Hugo já haviam esquecido da gravação, o diretor da RCA ligou para Hugo perguntando pela fita. A canção foi lançada, mas sem nenhuma pretensão. Fortemente influenciada pela disco music americana (em especial a cantora Tina Charles), em poucos dias a música de Elizângela vendia cerca de 20 mil discos por semana em todo Brasil. Em 5 meses já passava de 500 mil. E em um ano ultrapassava 1 milhão.  

Elizângela chegou a gravar outro sucesso no ano seguinte, Esperando Você, lançado em 1979. Após o sucesso, a atriz sofreu pressão da indústria fonográfica e resolveu desistir do mundo da música. Dessa forma, sem poder dividir o sucesso das novelas com os sucessos dos discos, acabou por encerrar prematuramente sua carreira de cantora. Mas o carisma e simpatia como atriz continuam inabaláveis até hoje. Sua galeria de personagens marcantes e divertidas nas novelas é imensa. Entre muitas, destacam-se a mimada Patrícia de Locomotivas (1977), a dissimulada Mariúcha de Jogo da Vida (1981), a obsessiva Marilda de Roque Santeiro (1985), a extravagante Rosemary de Pedra Sobre Pedra (1992), a fogosa Magnólia de Por Amor (1997), a chantagista Djenane de Senhora do Destino (2004), a cafetina Cilene de A Favorita, a divertida Nicole do remake de Ti Ti Ti (2010) e, atualmente, a Íntima de Aquele Beijo, cuja eterna vocação é ser 'mãe de miss'.